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Roteiro de Debates sugere parcerias da EBC com escolas de cinema e teatro

  • 21/10/2013 19h14

O Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) se debruçou na última terça-feira, 15, sobre os conteúdos de dramaturgia e ficção veiculados pela Empresa. Durante mais uma edição do Roteiro de Debates, o colegiado recebeu Heloísa Toledo Machado, professora da Universidade Federal Fluminense (UFF), e André Pellenz, realizador audiovisual, para discutir o tema com conselheiros (as), empregados (as) da casa e sociedade civil. Como mediador, o evento contou com Paulo Derengoski, conselheiro.

Algumas ações concretas foram propostas, como a criação de um núcleo de dramaturgia, o estabelecimento de parcerias com escolas de teatro e cinema, além da adaptação de obras literárias para a televisão. O debate, porém, abarcou questões como estética, mercado audiovisual e o papel da TV pública, contribuindo para o desenho de diretrizes para essa programação.

Inovação

André Pellenz escreveu e dirigiu para a TV Brasil, em 2011, a série dramática "Natália", atualmente na grade da TV Globo Internacional, além de dirigir dois curtas-metragens infantis exibidos pela emissora: “O Menino Mofado” e “Que Horas São?”. Segundo ele, a maioria dos produtores brasileiros se identificam com a TV pública, especialmente por sua liberdade criativa.

“A TV pública pode se permitir fazer projetos ousados, ela pode correr riscos temáticos, estéticos e não estar amarrada a anunciantes ou a um padrão”, afirmou André. O produtor acredita que a EBC precisa inovar, apesar dos riscos que isso pode trazer à audiência de sua programação. “Não que você tenha que correr riscos sempre, porque é legal ter resultados. TV é resultado, não adianta fazer e ninguém ver, mas eu tenho certeza que as pessoas querem ver algo que tem mais pegada do que a das TVs comerciais”.

Ivan Costa, empregado da EBC, concordou: “pode ser um papel da comunicação pública fazer a vanguarda artística da TV brasileira. Houve um boom da TV fechada depois da Lei do Cabo, só que as emissoras são muito acanhadas em matéria artística. A TV pública pode trazer o que uma TV a cabo nunca compraria”. Ele acredita que a linguagem da telenovela está perdendo sua efetividade com os jovens e que não existe no Brasil um modelo que faça frente a dominação das produções norte-americanas. Ele acrescentou que muitos funcionários da casa estão aptos para trazer mudanças e que é preciso aproveitar esses talentos.

Qualidade e investimento

A professora Heloísa Toledo, atriz e diretora, coordena um projeto de pesquisa na UFF sobre a Ficção na TV Pública como fator de transformação social. Ela realizou uma análise dos programas de ficção e dramaturgia da TV Brasil e das rádios da EBC para o debate e concluiu que “a programação possui qualidade cultural impecável”.

Para ela, a EBC possui o papel de transformar o panorama cultural do país através da TV, onde a dramaturgia tem lugar essencial. “A dramaturgia precisa funcionar como veículo de incentivo para a consciência crítica – Bertolt Brecht dizia isso”, lembrou.

André pontuou que, para se ter qualidade na dramaturgia, é preciso pagar bem os produtores. “Claro que as pessoas também são atraídas pelo interesse no projeto, mas é preciso aumentar a qualidade da produção. É possível atrair bons profissionais, ninguém tem preconceito com a TV pública, mas é preciso casar a liberdade criativa com valores compatíveis de mercado e uma divulgação eficiente”.

Murilo Ramos, conselheiro, concordou com a necessidade de investimento. “Tenho certeza que saberíamos fazer dramaturgia de qualidade. O gargalo é o dinheiro. Fazer TV é muito caro, mas o dinheiro existe e está indo pras grades da Sony, Warner, etc”. Ele explicou que a maior parte do dinheiro que fomenta a produção audiovisual no país sai do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), porém, após a produção, todo esse material é exibido principalmente em salas de cinema e na TV paga.

“Um bilhão é o montante anual aproximado que a Ancine passa a administrar no FSA. A grande crueldade do trabalho da agência é que não há uma discussão de uma política de distribuição. Falta uma política que põe a mão nesse dinheiro”, afirmou, citando um texto de Gustavo Gindre, servidor da Ancine.

Para Rogério Brandão, Diretor de Produção da EBC, mais do que garantir orçamento, é preciso haver uma definição da Empresa sobre as suas prioridades de investimento. “Temos a necessidade de assumir ou não um papel de protagonista na distribuição de conteúdo audiovisual. É preciso ter uma convicção interna, mais do cumprir uma cota estabelecida”, afirmou.

Ana Fleck, presidenta do Conselho, e Regina Lima, ouvidora da EBC, concordaram. “Queremos que a Empresa firme compromissos de prioridades. Às vezes me parece que a atividade-meio ganha mais importância que a atividade-fim”, cobrou Ana. Regina acredita que a EBC precisa definir uma vocação e em quais temáticas deseja investir.

Exibir ou produzir

A professora Heloísa Toledo informou que do total de conteúdo sobre ficção e dramaturgia presente na TV Brasil, apenas 1,98% é de produção própria, 80,55% de licenciamentos e 17,7% feitos por meio de parcerias. De todo este total, 72,3% é de conteúdo estrangeiro.

“O debate que ouvimos aqui é o mesmo que acontece em todas as emissoras no país: entre ser exibidora ou produtora de conteúdo. Ninguém achou ainda a resposta”, disse André Pellenz. A debatedora Heloísa Machado ofereceu uma proposta: “a TV pública tem a missão de transmitir produções independentes, mas pode produzir numa escala de 10 a 20% de produção própria e fazer séries, seriados, novelas, teatros filmados, gêneros inovadores”.

André defendeu que as mídias públicas precisam acolher diferentes níveis de produção independente, do mais amador ao profissional. “Não podemos ter preconceito ao contrário. É saudável fazer uma mistura de pessoas conhecidas com desconhecidas. É preciso ter espaço pra quem é pequeno, mas na medida do seu tamanho”.

Diversidade

Tema recorrente nas discussões do colegiado, a diversidade na programação foi novamente lembrada pelos conselheiros. “Nossa missão mais difícil e mais bela é dar voz ao que não tem voz”, disse Eliane Gonçalves, representante dos empregados da EBC no Conselho.

Para a colega, conselheira Rita Freire, a negação do Brasil se dá pela televisão – os programas ignoram o negro, a cultura regional e outros grupos minoritários. “Minha sugestão ao Conselho é que façamos um Roteiro de Debates exclusivo sobre diversidade nos conteúdos da EBC”.

O conselheiro e presidente do Olodum, João Jorge, acrescentou ainda que a TV Brasil deve ocupar a lacuna aberta para tratar de assuntos tabus. “A programação da EBC tem bons programas, coisas plásticas, mas tem que se diferenciar, ser o contraponto do que está posto. Tem que arcar com o ônus de ser diferente e incluir os afrodescendentes, os indígenas, o popular”. Eduardo Castro, diretor-geral da Empresa, afirmou que a EBC deverá assinar Programa Pró-Equidade de Gênero e Raça da Secretaria de Políticas para as Mulheres, da Presidência da República. Segundoe ele, essa maior equidade interna da empresa, pode-se refletir naturalmente na produção mais diversificada de conteúdo.

Faixas

O conselheiro Takashi Tome lembrou uma demanda antiga do Conselho de se operar mudanças na faixa de programação juvenil da TV Brasil. Segundo ele, a programação precisa ser revista com caráter de urgência, pois compromete a qualidade da emissora.

Mário Jakobskind, também conselheiro, sugeriu a criação de programas de humor nos veículos da EBC, o que recebeu o apoio de André Pellenz: “existe um espaço para humoristas no Brasil inteiro e a TV pública pode funcionar muito aí”.

Veja mais fotos do Roteiro, aqui.

Assista o vídeo com a íntegra das gravações do evento, aqui.

Texto: Priscila Crispi (jornalista da Secretaria Executiva do Conselho Curador).
Fotos: Ana Migliari (TV Brasil)