Sociedade civil reage às ameaças de presidenciáveis à EBC

28 de agosto de 2018

A Frente em Defesa da EBC e da Comunicação Pública, organização que reúne dezenas de entidades da sociedade civil brasileira e da qual o Conselho Curador cassado da EBC participa, lançou nota de repúdio aos recentes ataques feitos por candidatos à presidência da República à EBC. Confira a nota na íntegra e as mais de 50 organizações signatárias:

NOTA PÚBLICA

FRENTE EM DEFESA DA EBC E DA COMUNICAÇÃO PÚBLICA

A Empresa Brasil de Comunicação (EBC), principal expoente do sistema público de comunicação no país, vem sofrendo ataques injustos neste período eleitoral. Os mais incisivos partiram dos candidatos à presidência da República Geraldo Alckmin (PSDB), Jair Bolsonaro (PSL) e João Amoêdo (Novo). Os três candidatos fizeram críticas públicas e já prometeram aos seus eleitores que vão “extinguir” ou “privatizar” a EBC.

Tais ameaças, no entanto, confrontam a lei máxima do país. Afinal, a existência da EBC não é mera vontade ou determinação deste ou daquele governante, mas sim um mandamento da Constituição, que em seu artigo 223 prevê “o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal”. O reconhecimento deste caráter veio, por exemplo, na posição do Ministério Público Federal, via Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, que classificou como inconstitucional a Medida Provisória assinada por Michel Temer em 2016 que acabou com a participação social na empresa (via extinção do Conselho Curador) e com o mecanismo que não permitia mandato coincidente do presidente da República com o da EBC.

Os ataques à EBC também contrariam a defesa de organismos internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização dos Estados Americanos (OEA). Em texto sobre a importância da existência da comunicação pública no mundo, a ONU salienta: “A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) celebra o serviço público de radiodifusão, uma instituição que tem contribuições notáveis em todo o mundo para a luta comum por democracia”. O relator para a Liberdade de Expressão da Comissão Inter-americana de Direitos Humanos (OEA), Edison Lanza, deu declaração em 2016 na mesma linha, ao se referir à EBC: “A iniciativa de desenvolver uma emissora pública nacional alternativa com status independente foi um esforço positivo para a promoção do pluralismo na mídia brasileira; em especial, considerando-se os problemas de concentração da propriedade dos meios de comunicação no país”.

A existência de uma comunicação pública forte e que chegue a toda população não é novidade, por exemplo, em países como Alemanha, Austrália, Canadá, Colômbia, Espanha, Estados Unidos, França, Itália, Japão, Portugal e Inglaterra. Por que no Brasil seria diferente? Tais candidatos querem negar o direito à informação dos cidadãos, inclusive o de buscar uma emissora não orientada pelo lucro e que não esteja atrelada aos mandos e desmandos governamentais?

A realidade é que, na história, nenhum país democrático do mundo abdicou do sistema público de radiodifusão. Os países europeus, por exemplo, quebraram o monopólio original de seus sistemas, abriram o setor ao mercado, mas conservaram suas rádios, TVs e agências públicas de notícias. Afinal, entenderam que elas cumprem um papel específico na democracia, ampliando a pluralidade e garantindo a expressão da diversidade. O Brasil, tendo implantado tardiamente a empresa holding desse sistema, evidente que erraria novamente suprimindo o que já foi construído. E tal sistema faz-se ainda mais necessário em um país que, ainda que plural e diverso como o nosso, é marcado por um cenário de concentração dos meios de comunicação e de influência de políticos neste setor.

A EBC, que não resume a comunicação pública mas é sua principal expressão no país, cumpre uma função social relevante e inovadora na mídia nacional. A TV Brasil, por exemplo, foi historicamente a maior exibidora em TV aberta – e portanto gratuita – do cinema produzido no país, além de ser a única emissora com programação infantil. Transmitiu, ainda, com audiências recordes, os campeonatos de futebol das séries C e D do Brasileirão, afinal, o futebol é considerado o principal esporte para milhões de brasileiros e as transmissões privadas seguem privilegiando o eixo RJ/SP. Em matéria divulgada em agosto, o portal UOL registrou que a emissora se encontra já na décima posição entre as emissoras mais assistidas do país, com um crescimento no ibope de 64% nos últimos anos, notadamente da programação infantil.

A Agência Brasil é a agência de maior alcance do país, disponibilizando conteúdos gratuitos a todo tipo de veículo de comunicação. São 3 milhões de visualizações por mês, sem contar o uso das notícias por outras mídias. Já a Radioagência Nacional disponibiliza, em média, 80 matérias por dia em áudios gravados que são acessados por mais de 4.500 emissoras de rádio. A Rádio Nacional da Amazônia é um fenômeno comunicacional do Norte e do Nordeste, chegando aos locais mais afastados com programação de qualidade e sendo, muitas vezes, para milhões de brasileiros e brasileiras que vivem nessas regiões, o único veículo de comunicação disponível. As rádios MEC e Nacional (em Brasília, no Rio de Janeiro e na região Norte) são referências históricas, com informação regionalizada e dando espaço para a arte brasileira em sua diversidade. Os festivais da Rádio Nacional seguem atraindo e reconhecendo artistas independentes de várias regiões do Brasil.

Preocupados com as ameaças a essa empresa que executa uma diretriz da Constituição e cumpre uma função fundamental à sociedade brasileira, as entidades signatárias reafirmam sua defesa da comunicação pública e da empresa. Em vez de ataques, seus veículos, trabalhadoras e trabalhadores merecem ser fortalecidos para que possam cumprir de maneira mais adequada seus objetivos. Uma conquista tão árdua da sociedade brasileira não será entregue assim de mão beijada, afinal, defender a comunicação pública é defender a democracia!

Frente em Defesa da EBC e da Comunicação Pública

Assinaturas: Conselhon Curador cassado, e organizações em defesa da EBC

1) Integrantes do Conselho Curador

Conselheiras(os)

Akemi Nitahara

Ana Veloso

Daniel Aarão Reis

Enderson Araújo

Evelin Maciel

Isaías Dias

Joelzito Araújo

Guilherme Strozzi

Letícia Matza Yawanawa

Mario Augusto Jakobiskind

Rosane Bertotti

Murilo César Ramos

Takashi Tome

Venício Lima

Presidentas do Conselho

Ana Luiza Fleck Saibro

Ima Vieira

Rita Freire

Presidenta/e da EBC

Tereza Cruvinel

Ricardo Mello

Ouvidor(as) da EBC

Laurindo Lalo Leal Filho

Regina Lucia Alves de Lima

Joseti Marques

2) Organizações

AMARC Brasil (Associação Mundial de Rádios Comunitárias) e as representações da AMARC na América Latina e Caribe

Articulação de Organizações de Mulheres Negras do Brasil (AMNB)

Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária – Abraço Brasil

Associação Cultural de Mulheres Negras – ACMUN

Blogueiros Progressistas de SP (Blog-Prog-SP)

Casa da Mulher Catarina – ACMC

Casa Frida

Central Única dos Trabalhadores (CUT)

Central Única dos Trabalhadores de Santa Catarina (CUT-SC)

Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé

Centro de Pesquisa em Comunicação e Trabalho da ECA/USP (Universidade de São Paulo)

Ciranda Comunicação Compartilhada

Coletivo de Mulheres da EBC

Comissão de Empregados da EBC

Comissão Nacional de Jornalistas pela Igualdade Racial do DF (CONAJIRA)

Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial no DF (COJIRA-DF)

Comitê Mineiro pela Democratização da Comunicação (FNDC-MG)

Conselho Curador cassado da EBC

Confederação Nacional das Associações de Moradores (CONAM)

Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (CONTEE)

Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços (CONTRACS)

Escola de Comunicação da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro)

Ex-presidentes (as) da EBC: Tereza Cruvinel e Ricardo Melo

Federação Interestadual dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (FITEE)

Federação Interestadual dos Trabalhadores e Pesquisadores em Serviços de Telecomunicações (FITRATELP)

Federação Nacional dos Trabalhadores em Processamento de Dados (FENADADOS)

Fórum das Juventudes da Grande BH

Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC)

Frente Ampla pela Liberdade de Expressão e Democratização da Comunicação de São Paulo (Frentex-SP)

Frente Brasil Popular

Geledés – Instituto da Mulher Negra

Grupo de Pesquisa em Políticas e Economia Política da Informação e da Comunicação (PEIC/UFRJ)

Internet Sem Fronteiras – Brasil

Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social

Instituto Coexista

Instituto de Mulheres Negras do Amapá (IMENA)

Instituto Imersão Latina

Instituto Observatório Social

Jornalistas Livres

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)

Movimento Negro Unificado (MNU)

Odara – Instituto da Mulher Negra

Pontão de Cultura Digital / UFRJ

Portal Terra Sem Males

Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal

Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo

Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro

Sindicato dos Professores do Estado de Minas Gerais (Sinpro Minas)

Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente no Estado da Bahia (SINDAE)

Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão no Estado de São Paulo

Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão no Distrito Federal

Sindicato dos Trabalhadores em Entidades de Assistência e Educação à Criança, ao Adolescente e a Família do Estado de SP (SITRAEMFA)

Sindicato nos Trabalhadores Públicos Federais no Estado de Santa Catarina (SINTRAFESC)

Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Municipal de Florianópolis (SINTRASEM)

Sitokore - Organização de Mulheres Indígenas do Acre

ULEPICC-Brasil (União Latina da Economia Política da Informação, da Comunicação e da Cultura – Capítulo Brasil)

União de Negras e Negros pela Igualdade (UNEGRO)